Na última terça-feira (22), o ministro Flávio Dino, recém-empossado no Supremo Tribunal Federal (STF), usou a sessão da 1ª Turma para criticar o que chamou de “juristas de internet” — pessoas que comentam temas jurídicos nas redes sociais sem, segundo ele, a formação adequada ou experiência profissional na área do Direito.
Em tom de desdém, Dino afirmou que tem se deparado com “juristas” que nunca publicaram um livro, não têm formação acadêmica reconhecida e jamais foram aprovados em concurso público, insinuando que essas vozes deveriam ser descartadas por falta de autoridade técnica.
“Como não os conheço, e por hábito desconfio da minha própria ignorância – o que considero uma atitude saudável – vou pesquisar. E aí descubro que o jurista em questão não publicou um único livro, não possui qualquer título acadêmico e jamais foi aprovado em concurso público”, declarou Dino.
A incoerência no próprio plenário
A fala, no entanto, gerou críticas e apontamentos de incoerência, principalmente porque três dos atuais ministros do STF — Dias Toffoli, Nunes Marques e Cristiano Zanin — não seguiram o percurso meritocrático tradicional exaltado por Dino.
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Toffoli, por exemplo, não passou no concurso para juiz substituto e chegou ao STF após ter sido advogado do PT e advogado-geral da União no governo Lula.
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Zanin, que chegou à Corte em 2023, ficou conhecido por ser advogado pessoal do presidente Lula e não possui concurso público no currículo.
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Já Nunes Marques foi indicado por Bolsonaro e chegou ao TRF-1 por meio do Quinto Constitucional, que dispensa concurso e permite a nomeação de advogados para vagas nos tribunais.
Dino, que fez carreira como juiz federal e já ocupou o cargo de ministro da Justiça, pareceu desconsiderar essas realidades ao propor que o peso das opiniões jurídicas deva se basear apenas em titulações formais ou concursos públicos.
Ironia no plenário
A ministra Cármen Lúcia também entrou no debate, usando seu conhecido sarcasmo para comentar a banalização do termo “jurista”:
“Às vezes, ‘jurista’ tem outras conotações. Por exemplo, quem empresta dinheiro a juros também é jurista”, ironizou, arrancando risos do plenário.
Discussão acende alerta sobre elitização do debate jurídico
As falas de Dino suscitaram um debate mais amplo sobre a democratização do conhecimento jurídico e a legitimidade da participação popular na interpretação das leis — especialmente nas redes sociais, onde especialistas e leigos discutem ativamente decisões do STF.
A tentativa de desacreditar vozes fora da academia ou do serviço público pode ser vista como um afastamento da Corte com o debate plural e, como muitos apontam, um risco à liberdade de expressão, especialmente num contexto de crescente judicialização de temas políticos e sociais.
Ao criticar “juristas de internet”, Flávio Dino não só provocou reações dentro do próprio STF como também levantou questionamentos sobre quem, afinal, tem o direito de opinar sobre o Direito no Brasil.